O Governo vem cada vez mais assumindo um discurso marcado por uma nota de forte optimismo face a alguns sinais económicos positivos que vão sendo destacados.
A UGT não pode, porém, deixar de assinalar que tal discurso nos parece manifestamente desadequado face a outros indicadores disponíveis, à situação social do País e às reais dificuldades que continuamente são impostas e diariamente são vivenciadas e sentidas pelos trabalhadores, pensionistas, reformados e desempregados.
Com efeito, a UGT deve manifestar agora, como sempre, as suas reservas quando as condições de vida e de trabalho — elevada taxa de desemprego, atingindo particularmente os jovens, baixas taxas de criação de emprego, insustentável redução dos salários e das pensões, crescimento das situações de pobreza e das desigualdades, fuga para o estrangeiro por falta de condições no País, sobretudo da geração mais jovem e melhor qualificada — continuam a deteriorar-se, fazendo perigar os mínimos de dignidade e de sobrevivência dos portugueses.
Por outro lado, a UGT não pode aceitar que o Governo, destacando a revisão em alta do crescimento económico, o resultado do exercício orçamental de 2013 — que ultrapassou as metas acordadas com a Troika — ou ainda uma aparente retoma da confiança empresarial para o investimento, persista em não aproveitar as margens de manobra e as folgas orçamentais existentes para atenuar o rumo de uma política que soma austeridade sobre austeridade.
Esta obstinação, aliada a uma profunda insensibilidade social do Governo, são bem patentes no Orçamento do Estado para 2014 e no Orçamento Rectificativo entretanto apresentado à Assembleia da República.
Face a um Orçamento do Estado de mais sacrifícios e austeridade, com um agravamento dos cortes nos salários da Administração Pública e do Sector Empresarial do Estado e o forte ataque, por diversas vias, às pensões (alteração ao regime de aposentação, corte nas pensões de sobrevivência e nos complementos de pensões, manutenção da contribuição extraordinária de solidariedade, não obstante o seu carácter transitório), que nos parecem atentar contra princípios constitucionais que devem estar presentes num verdadeiro Estado de Direito democrático, a UGT interpelou o Presidente da República, os partidos políticos com assento parlamentar e o Provedor de Justiça, com vista a assegurar o pleno cumprimento da nossa Constituição.
Não temos a ilusão de ter sido a UGT a determinar os pedidos de fiscalização de constitucionalidade já realizados, ou os que serão realizados, mas estamos certos que os argumentos e as posições expressas pela UGT foram ouvidos e atendidos, nomeadamente pelos partidos políticos com os quais já reunimos.
A necessidade de uma intervenção do Tribunal Constitucional faz-se igualmente sentir, e a UGT a tal instará, nomeadamente na reunião que aguardamos com o Presidente da República, face a um Orçamento Rectificativo que novamente ataca os mesmos alvos - funcionários públicos e pensionistas - por via do agravamento da CES e do aumento das contribuições para a ADSE.
São sacrifícios que, sob uma pretensa égide de reforço de sustentabilidade dos sistemas públicos, no caso sistemas das áreas da saúde e da protecção social, vêm novamente apenas reduzir os custos, ou aumentar receitas do Estado, na medida em que as verbas recolhidas são desviadas para o combate ao défice orçamental.
Por outro lado, este orçamento rectificativo soma sacrifícios a sacrifícios, seguindo a via de ir testando os limites da constitucionalidade de medidas já aceites no passado, o que apenas agrava os riscos de uma governação à margem da Constituição.
A UGT não pode deixar aqui de manifestar a sua oposição a uma estratégia que é comum ao OE 2014, à proposta de OE rectificativo e à política económica e social em geral. Com efeito, assistimos a opções ideológicas, pelas quais o Estado se vem demitindo mais e mais das suas responsabilidades sociais e coloca em causa o papel, e o próprio funcionamento, dos sistemas e serviços públicos, em áreas centrais como a protecção social, a saúde, a educação e o emprego. Esta é uma via que a UGT rejeita liminarmente e que parece evidenciar bem o que será de esperar da pretendida Reforma do Estado.
A UGT deve registar as dificuldades em tornar consistentes as consequências de um pseudodiálogo que tem marcado a construção e a definição das políticas deste Governo, a qual é particularmente gravosa quando se trata de matérias que directamente respeitam a trabalhadores e empregadores, como é o caso dos sistemas de protecção social.
Este vazio é aliás sentido e notório em todos os níveis de relações laborais, começando na concertação social. A CPCS tem sido marcada cada vez mais pela inexistência de uma verdadeira agenda e por uma minimização do papel dos parceiros sociais, reduzindo-a à discussão de temas acessórios, ou a uma sede de mera audição e não de construção de compromissos.
A última reunião de concertação social, realizada a 29 de Janeiro, foi disso exemplo. O Governo, na sequência do chumbo do Tribunal Constitucional sobre os despedimentos por extinção do posto de trabalho e por inadaptação, prepara-se para alterar de novo o Código do Trabalho, escudando-se num acordo tripartido que tem sistematicamente desrespeitado, esquecendo o real contexto em que foi celebrado, nomeadamente o Memorando de Entendimento que o condicionou.
Esta é uma alteração que nos suscita reservas por esses motivos, pelo seu conteúdo, cujo risco de inconstitucionalidade é elevado, e pelo contínuo desequilíbrio na execução do acordo tripartido, penalizando sempre prioritariamente os direitos dos trabalhadores.
A UGT não aceita ser apenas vista como um parceiro credível e responsável, assumindo o seu empenho na manutenção de uma desejável estabilidade social, mas exige que tal responsabilidade e empenho sejam correspondidos por uma postura idêntica de responsabilidade, abertura, diálogo e cumprimento de compromissos por parte dos responsáveis governativos.
O vazio negocial estende-se igualmente à própria negociação colectiva, em que o Governo se demite dos seus compromissos e competências, enquanto dinamizador e enquanto empregador, e surge mesmo como um obstáculo a uma mais efectiva regulação do mercado de trabalho, distanciando-se da UGT e dos seus sindicatos e refugiando-se na troika, sempre como escudo protector da sua inoperacionalidade e incumprimento.
Este vazio é uma situação insustentável que a UGT considera essencial alterar e, relativamente à qual, parece existir uma cada vez maior convergência dos parceiros sociais.
O Secretariado Nacional da UGT, reunido a 30 de Janeiro de 2014, decide:
30-01-2014
APROVADO POR UNANIMIDADE